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Foto: Érica Perotto |
Era uma manhã normal de "periguetagem".
Periguetar - do verbo ir ao mercado fazer compras de mês com a nora e a filha. Com direito a café da manhã na rua, ótimos papos e muitas risadas...hihihi.
Existem outros significados pro termo, mas esse é o nosso, de uso pessoal.
Depois das compras, no estacionamento, ele chegou. Festivo, até meio eufórico.
- Olha só! Só porque aposentou não lembra mais dos amigos...
E veio trazendo o sorriso de X e os braços abertos em minha direção. Eu, pega de surpresa, dei um sorriso amarelo - sem X, eu acho. Ele continuou:
- Tá lembrando de mim?
- Acho que tô. (Claro que não! Embora ele parecesse familiar... Que droga! Isso sempre acontece comigo. Minha memória se diverte ao me fazer passar vexame).
- Você está ótima!
- E você, o que conta de novo? (Velha tática pra tentar obter informações)
Então a expressão dele mudou. O sorriso de X deu lugar a um rio de lágrimas sobre seus olhos... Do riso fez-se o pranto...
- Lembra do meu irmão, o Carlão?
Agora piorou, pensei. Além de não lembrar dele ainda vou não lembrar do Carlão... E o assunto prosseguiu:
- Carlão morreu. Um acidente horrível!!! Um pedaço dele ficou preso na maçaneta da porta do caminhão. Vai passar hoje na TV. Minha mãe tá desesperada e eu tenho que providenciar tudo. Fui comprar o caixão, mas é muito caro, faltou 98 reais. Então vim aqui ver se conseguia alguma ajuda. (No mercado? pensei). Você tem como me ajudar?
Eu ainda tava chocada com a tragédia do Carlão e seu pedaço preso à carroceria do caminhão quando ele falou:
- Você não lembrou ainda de mim, né? Qual o último lugar que você trabalhou?
- No Jardim
- Isso, é de lá - Voltou o sorriso de X.
Epa! Peraí! Do último lugar que eu trabalhei ainda lembro bem. E lá não tinha esse sujeito e nem irmão chamado Carlão. É um GOLPE!!!
Dispensei o sujeito. Quando entrei no carro minha nora perguntou:
- Quem era?
- Não faço ideia.
- Mas ele parecia tão íntimo...
E minha filha cantou: "Não era amor, era cilada..."
Ô mundo bandido!
Anita Safer