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Desenho inspirado em imagem do Google Imagens |
Hoje me peguei sentindo saudades das letras (acho que é porque estou treinando lettering, que é a arte de escrever letras em estilos diversos - é a minha atividade neste momento, minha estranha mania de fazer atividades diferentes a cada semestre...rs). O mundo digital, há pouco datilográfico, expulsou para as paredes das lembranças, as boas e velhas letras escritas de forma cursiva. Aquelas letras que eram esperadas nas cartas de amor; que identificavam os amigos e parentes.
Nas escolas as letras ainda teimam em existir, ainda que a contragosto das crianças da nova geração, que têm pressa e consideram desnecessário todo aquele esforço de bailar o pulso, com uma caneta em punho, para fazer desenhos em um pedaço de papel - e, vamos combinar, aquele quadro cheio de letrinhas cansa mesmo. É muito mais atraente e rápido passar os dedos por um teclado, cada vez mais futurista. Nos celulares as palavras querem formar-se sozinhas. Muitas vezes, O tal corretor ortográfico nos faz enviar mensagens absurdas e comprometedoras, como "Que Deus te elimine" ao invés de Deus te ilumine; vai que é um ato falho tecnológico...rs
Mas, voltando à nostalgia deste meu momento, lembro que o meu primeiro amor escrevia lindamente o número 2. Vamos dar um desconto, quando apaixonados achamos tudo lindo. Me recordo da letra bem desenhada da minha mãe. Ela foi alfabetizada mais tarde, então, escrevia seu nome com muito capricho e orgulho. As letras são tão variáveis e pessoais! Algumas têm pressa e passeiam quase deitadas, como se fossem motos fazendo curvas em um campeonato. Outras são pequenas, tímidas. Existem as altivas, longas, firmes. As enigmáticas, como aquelas de alguns médicos, em que se juntam alguns atendentes na farmácia tentando decifrá-las, como se fossem personagens de um filme do Indiana Jones. Soube de um médico que foi procurado pela enfermeira para falar sobre um medicamento que havia prescrito e ela não estava entendendo. O médico, com seus óculos na ponta do nariz, tentava, em vão, decifrar a própria escrita; quando a enfermeira avisou: Doutor, o papel está de cabeça pra baixo...
Minha neta agora está aprendendo as primeiras letras. Lindas letras espelhadas, que vão para onde querem, assim como ela. É a liberdade infantil, antes de sermos condicionados para que o mundo nos valide. E temos que aprender a escrever e também a ler, pois todos sabem, escreveu e não leu, o pau comeu... O que é não é uma verdade absoluta, pois convivo com uma pessoa que não sabe escrever nem o próprio nome e, no auge dos seus 84 anos, não nasceu ainda um ser humano capaz de passá-la pra trás. A sabedoria e inteligência são superiores às convenções.
Escrevo essas bem traçadas linhas, para dizer que sinto saudades das cartas, de reconhecer as pessoas queridas pela forma como escrevem seus "as" ou "xis"...
Me despeço agora, digitando essas letrinhas, sem ter a oportunidade de colocar os pingos nos is, aqui os is já vêm prontinhos. Mas vejo as letras aqui formadas, são as irmãs mais jovens das antigas cursivas e desenhadas com nossas mãos. Elas também formam palavras. Palavras formam ideias, mas esse assunto fica pra outro momento. Três pontinhos.
Anita Safer