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Foto: Tina Arce |
Estava no ônibus interestadual. Pela janela via o céu e suas nuvens branquinhas de algodão doce. Minha mente viajou para o passado.
Me vi deitada na grama da minha infância olhando pro céu. Horas eram usadas nesse exercício. As nuvens passavam vagarosas, fazendo e desfazendo formas. Um bicho aqui, um objeto ali. Jesus acenando. Meu Deus, Jesus está desmanchandoooo! Às vezes ficava sozinha; em outras algum coleguinha também participava do doce delírio e tentávamos compartilhar impressões. Nem sempre conseguíamos ver a forma que o outro via, mas era uma festa quando isso acontecia.
Eu acreditava que o céu e as nuvens estavam ali pra me servir. E quando era a noite, achava que o som que os grilos emitiam era o som das estrelas. E elas brilhavam pra quem? Pra mim, é claro. Eu era o centro do Universo, pelo menos do meu Universo...rs.
Lembro da minha decepção quando o céu resolveu desaguar e transformar em lama meu caminho em direção à igreja. Como ele pôde ser tão insensível? Era o dia da minha primeira comunhão. Eu estava muito compenetrada com aquele acontecimento. Desejava ser uma freira, quiçá, uma santa. Os respingos de lama sujariam meu longo vestido branco e meu sapato branco novinho. Era um sapato envernizado. Que desaforo! Mas não foi um respingo de lama que destruiu meu sonho de santidade. Um primeiro beijo jogou por terra minha suposta vocação.
É bom relembrar esses momentos. Faz minha criança interior sorrir. Hoje olho a imensidão do céu e ele sorri de mim. Porque ele sabe que eu irei embora em algum momento e ele irá continuar. Ontem eu olhava de baixo para ele lá em cima. Hoje ele olha lá de cima para mim. Mas no futuro, eu já tendo virado pó, quem sabe minhas partículas subam em direção à imensidão e eu me junte ao céu? Seremos um só, passeando pelas galáxias, vendo das alturas as pessoas lá embaixo olhando para nós, achando que estamos bem acima e distantes. Essa distância é uma ilusão. Carl Sagan já dizia que somos feitos da poeira das estrelas. Logo, eu e você não somos o centro do Universo, mas fazemos parte dele.
Anita Safer.