sábado, 30 de maio de 2020

Saudade do calor, né, minha filha?

São sete horas da manhã. Já estou de pé. Por que, meu Deus do céu? O dia será longo e não há tanto assim a ser feito. O pão de leite comprado ontem grita por um café. Como negar? Mas o café quente, especialista em esquentar a alma não surte efeito. Tudo porque uma frente fria, vinda sei lá de onde, bate de frente com meu DNA nordestino, que é todo trabalhado no calor. Resolvo então voltar pra cama. Ninguém precisa saber, né? Dormir mais um pouquinho não fará diferença no andar lento do dia. Cama tá ok. Coberta tá ok. Mas o sono não vem. Então pego o livro e alterno suas folhas com as mensagens que chegam. Respondo, volto, leio. "dingling"... outra mensagem, respondo, volto, leio. Nas páginas do livro o Dr Macbeth acorda meio sem saber quem é e onde está. Aquela sensação que todos temos às vezes, especialmente quando dormimos fora de hora. Ele é psiquiatra, deve entender melhor essas coisas... "dingling"... Preciso levantar às 11 horas pra fazer almoço. Meu DNA continua lutando com o frio. Preciso agir. Não posso passar o dia deitada, lendo e trocando mensagens debaixo do cobertor quentinho e macio. Ahhhh... que delícia. Tá. Posso, mas o almoço precisa de um apoio pra acontecer. Depois de muito relutar resolvo tomar um banho. Entre tirar a roupa e entrar debaixo do chuveiro o tempo parece longo, mas me apresso, como se minha vida dependesse dessa pressa. Pronto! A água quente começa a escorrer pelo meu corpo. Aos poucos vou me reconhecendo; como o doutor do livro começa a se ambientar com o quarto do hotel. Essa sou eu, a mulher que veio do calor. Minha mente começa a se agitar e me imagino sendo uma sereia que vive em uma piscina em Caldas Novas, ou quem sabe na Pousada do Rio Quente (nunca fui nessa pousada, mas com esse nome deve ser uma maravilha!). Quero eternizar esse momento. Viveria pra sempre dentro desse banheiro, esfumaçado, reconfortante. Ficaria assim, mas sou defensora do controle do uso da água.
Essa ambientalista que vive em mim não permite negociação. Com muito custo e relutância desligo o chuveiro. Agora que tomei posse de quem sou posso voltar minha atenção às coisas do dia. Quem sabe mais tarde retorno à cama, à coberta, ao livro... "dingling"...

Anita Safer