sábado, 18 de janeiro de 2014

Brasília e seus janeiros

                                                                       Foto: Liana Rocha

Quando é janeiro a cidade se cala. Assim sinto Brasília todos esses janeiros que tenho vivido aqui. Parece uma criança que tagarela o dia todo e quando dorme você olha pra ela e pensa, é tão linda dormindo, parece um anjo. Quando Brasília adormece podemos ver com calma sua beleza. O trânsito flui devagar e gostoso – ok, já foi melhor, eu sei. Os ônibus nos recebem com lugares diversos, vazios, convidativos – nem de todas as linhas, sei disso também, não precisa me lembrar. Mas nesta época reina uma atmosfera que faz com que eu repare em coisas que não reparo habitualmente. Um morador de rua está deitado no chão do ponto de ônibus. Ele lê livros didáticos que buscou nas estantes culturais do T-Bone. Com um toco de lápis ele tenta responder às questões dos livros. Ele também está usufruindo do momento parado da cidade. Na rede social vejo fotos e mais fotos de viagens. Muitos amigos que estão de férias  estampam seus sorrisos cheios de praia e sol. Brinco com as amigas dizendo que elas estão horríveis de sujas (na verdade estão com um lindo bronzeado, é que a invejinha me aflora um lado meio perverso... haha). Eu, como sempre, estou trabalhando nesta época. Antigamente odiava isso. Ter que trabalhar quando meus filhos estavam de férias?!?  Era o fim. Os filhos estão adultos e esta fase passou. Hoje vivo outro momento. Amo tirar férias fora de temporada. As coisas são menos caras. Os lugares estão mais vazios. Viajar é uma das coisas de que mais gosto na vida, uma forma boa de me conhecer melhor. Temos sempre a impressão de que um lugar diferente vá fazer com que a gente se sinta diferente. Isso nem sempre acontece, porque, normalmente, escolhemos as roupas e acessórios que estamos levando, mas não temos como selecionar nossa bagagem emocional. Minha avó dizia uma frase engraçada para esses casos - “Besta aqui, besta em qualquer lugar”. Não é o lugar que muda algo, é o que há dentro de nós que pode fazer com que nossos sentimentos sejam felizes ou não; independente de onde estivermos; porém, olhar outras paisagens quase sempre me inspira. Prefiro fazer minhas viagens de ônibus, justamente para acompanhar a mudança da paisagem, dos sotaques, das árvores, dos cheiros, das fisionomias. O mais divertido é fazer todo um planejamento e as coisas saírem sempre diferentes do planejado. É grande a possibilidade de as coisas não acontecerem exatamente como nós gostaríamos. Isso tem um lado positivo, podemos vivenciar situações inusitadas e agradáveis, que não aconteceriam se nossos planos tivessem vingado. De cada viagem uma lembrança. O suco maravilhoso de Aracaju, a comida de Blumenau, a deliciosa hospitalidade mineira em São João Del Rey, meus amigos de infância de Jundiaí em Caldas Novas (recém conhecidos), os dedos colados com aquela cola (que tudo cola) em Maceió... São Paulo... ah, São Paulo, deixou um gostinho de “quero mais”. Foram muitos os
lugares. Até mesmo Brasília já foi meu destino. Eu sei que moro aqui, mas queria ser turista, por isso me hospedei no Hotel Nacional – um sonho de infância – e avisei aos parentes e amigos que só me ligassem em caso de extrema necessidade; visitei os pontos turísticos da cidade, passeei com calma e admirei a arquitetura e o céu, lindos como nos cartões postais. Da minha “viagem” a Brasília, recordo-me com carinho das tardes nas livrarias, entre cafés e assuntos amenos com pessoas desconhecidas. Minha alma anseia pela próxima viagem, mas enquanto ela não chega vou usufruindo desta Brasília calada que meus amigos bronzeados e tagarelas deixaram por uns dias.

Anita Safer